Entrevista com o Mestre em Logística, Leoman Moutinho

Leoman Moutinho dos Santos  –  Natural de Salvador – Bahia

Formado em Ciências Contábeis pela UCSAL, Pós graduado em Contábeis pela FIB, pós-graduado em Metodologia do Ensino Superior na Visconde de Cairu, Pós-graduado em EAD na UCSAL, Mestre em Gestão Estratégica pela UNIFACS, trabalhou na Fundação Visconde de Cairú, Unime, Senai Cimatec, Unifacs, Helio Rocha, Faman, FTC, Faculdade Adventista, e tem  20 anos na vida acadêmica. Atualmente é Professor Universitário na UNIFACS e Consultor em Logística.

Trabalhou em pequenas, médias e grandes indústrias, foi desde auxiliar até gerente de logística, também trabalhou na Petrobrás, no Porto de Aratu e no Polo Petroquímico.

O professor Leoman Moutinho como é mais conhecido, tem uma larga experiência em logística e iniciou sua experiência quando os estoques ainda eram controlados em fichas Kardex (cada mercadoria tinha o controle feito em uma ficha de cartolina). Acompanhou a evolução do mercado nesta área e conhece com profundidade, as práticas e as tecnologias disponíveis. O Professor Leoman é um desses dicionários ambulantes que temos por ai, com grande conteúdo nas áreas de produção e logística. Convenci o Professor a nos compartilhar um pouco do seu rico histórico de vida. Gravamos esta entrevista em uma tarde de domingo, em um papo descontraído com este Mestre que já formou mais de 20.000 mil alunos entre graduação e pós-graduação.

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Leoman Moutinho em noite de autógrafo no lançamento do seu primeiro livro em 2007.

 

O professor Leoman reside atualmente em Feira de Santana onde desenvolve um trabalho na UNIFACS Feira. Em 2016/1 foi escolhido pelos alunos da entidade, um dos cinco melhores professores da UNIFACS FEIRA, entre os quase 700 do corpo docente.

O professor Leoman Moutinho costuma brincar muito com seus alunos, deixando o ambiente de sala de aula descontraído, onde todos ficam à vontade para fazer perguntas, quebram o gelo daquela vergonha de perguntar, e ai a turma fica mais produtiva. É comum ele chamar os alunos de Barão e os alunos fazerem o mesmo com ele. Essa é uma gíria que refere-se a pessoas mais abastadas, que não precisam de estudar ou trabalhar, pois já conquistaram o seu lugar ao sol. O Professor Leoman usa a gíria para brincar e também dar uma agulhadinha no aluno para que ele perceba que pode sim se tornar um Barão, porém, tem que estudar muito. (Barão era um título dado pelo Império brasileiro, aos homens da elite, grandes proprietários de terra ou políticos na época do Brasil Colônia).

 

Fiz um bate bola com o Professor Leoman, onde foram feitas perguntas ligadas a Logística, Gestão, e alguns conselhos para quem estuda. 

1 – (Adolfino Neto) Professor Leoman, como o Sr. vê o atual cenário da logística na Bahia, não somente do ponto de vista do transporte e armazenamento, mas um cenário geral?

[Professor Leoman] A Bahia já deveria estar com uma proposta logística muito mais avançada que a situação que se encontra hoje. A Bahia é o mais importante entroncamento rodoviário do Nordeste, porta de entrada desta região, local onde ocorre o cruzamento de três BRs (324, 116, 101 na cidade de Feira de Santana). Quem quer ir do Nordeste para o Sul ou vice-versa, terá que passar na Bahia. O estado deveria ser um destacado polo de apoio logístico a este movimento, mas, infelizmente não conseguiu alcançar o sucesso obtido em outros estados como Minas conseguiu com o Triângulo Mineiro, como Pernambuco está conseguindo com o porto de SUAPE. A Bahia tem ficado para trás devido a problemas políticos que são históricos. Não há um investimento sistemático para que este destacado polo logístico aconteça. No início da década de 2000, criou-se o PELTBAHIA- Programa Estadual de Logística de Transportes da Bahia, o que prometia resolver os problemas logísticos do estado, mas a evolução foi tímida, tendo apenas algumas ações executadas.

Além do problema governamental, há outro problema gravíssimo que faz o estado andar a passos curtos no cenário logístico. A maioria das empresas executam processos logísticos com a tecnologia de 20, 30 anos atrás, ou seja, são empresas que tem processos mais caros e com isso, contribuem para este cenário negativo que ocorre no estado. Também nas empresas, há um grande atraso na maneira de execução dos processos de gestão, dos processos administrativos dos negócios, o que provoca ineficácia. Os países de primeiro mundo descobriram isso na década de 60,70, onde passaram a fazer investimentos sistemáticos em logística e gestão das empresas, sendo algo que lhes permitiu a liderança mundial. Como exemplo, somos um país com dimensões continentais, e nossa malha ferroviária tem tamanho e números insignificantes, para não dizer, ridículos. Para que se tenha uma ideia, o Brasil tem em torno de 30 mil km de ferrovias, mesma quilometragem das ferrovias francesas, porém, o Brasil tem 8 milhões de quilômetros quadrados, e a França, 643 mil. Esse dado é suficiente para entender o restante da deficiência na logística brasileira, e consequentemente, baiana.

 

2 – (Adolfino Neto) Então, se o Senhor fosse pontuar, qual seria o principal problema para o atraso em que nos encontramos?

[Professor Leoman] Sem sombra de dúvidas, é a ignorância das empresas e dos governos no uso da tecnologia e dos processos inteligentes de gestão. Estamos vivendo a era da informação, ou seja, a informação está acessível a todos, e em todas as áreas. Não é possível entender porque governos e empresários sabem o que devem fazer, pois tem acesso a informação, mas insistem em fazer errado.  

 

3 – (Adolfino Neto) E no cenário nacional, como está a logística?

[Professor Leoman] O Brasil tem evoluído pouco em logística desde o governo FHC, porém há uma grande disparidade quando se analisa as regiões. No Sul e Sudeste do país, há uma evidente evolução bem maior que em todas as outras, e isso se deve a uma cultura mais difundida nessas regiões, devido serem o grande centro nervoso do país. Somente com políticas federais que democratizem a difusão do conhecimento logístico, vamos talvez em dez anos ter um cenário mais animador, com maior conhecimento logístico sendo aplicado em todas as regiões do país. Mais uma vez, temos aqui a presença do problema político, o qual provoca danos nos projetos logísticos. Devido ao apadrinhamento político, o governo nomeia para cargos técnicos, pessoas que não tem conhecimento da área, resultando em resultados insatisfatórios. O grande exemplo e  o PAC – Plano de Aceleração do Crescimento, o qual anda a passos de tartaruga devido a uma série de erros técnicos e políticos.

 

4 – (Adolfino Neto) Como está o cenário da Academia na área de Logística na Bahia?

[Professor Leoman] Devido minha a experiência de mais de 20 anos na Academia, me lembro que a literatura utilizada no Brasil há 15 anos atrás na área de logística era totalmente estrangeira, com títulos americanos, ingleses, e de outras nacionalidades do primeiro mundo. Essa literatura desconhecia os nossos casos logísticos e com isso, os alunos estudavam apenas modelos estrangeiros, o que é um ponto negativo, pois deveria haver o estudo de casos locais e internacionais. No início da década de 2000, surgiram os primeiros títulos feitos por escritores brasileiros e com estudos de casos brasileiros.

Antes dessa literatura nacional, estudava-se apenas a administração de materiais, na qual, estava inserido o assunto logística. Atualmente, todas as universidades e faculdades tem currículos melhores, com disciplinas específicas dentro do objeto de estudo logístico, sendo um bom avanço, porém, ainda há um atraso a ser vencido. O MEC – Ministério da Educação e Cultura ainda obriga a utilização de literaturas desatualizadas, prejudicando o conhecimento do aluno, pois o mesmo não tem contato em sala de aula com tecnologias como o Picking by Voice, Picking by Light, Transit Point, etc, os quais ele vai encontrar nas empresas, porém, desconhece. Este conteúdo tem sido dado de forma proativa pelos professores, os quais sabem que apesar da não obrigação, estão dando ao aluno, um diferencial de conteúdo. Visitas técnicas feitas a empresas tem sido muito utilizado como conteúdo adicional ao aluno, pois lá eles tem o contato direto com processos empresariais reais e com uso das mais novas tecnologias no ramo da logística.

 

5 – (Adolfino Neto) Por que a integração entre Empresa e Academia é tão tímida no Brasil?

[Professor Leoman] No Brasil, 95% dos doutores estão nas universidades e faculdades. Nos EUA, 95% deles estão nas empresas. Isso é um número alarmante da falta de integração entre nossas empresas e a academia. O incrível é que as pessoas que estão comandando as empresas, são pessoas que foram formadas na universidade, e isso deveria fazer com que as empresas estivessem muito mais próximas da Academia. Um exemplo deste afastamento, é que para marcar visitas técnicas a empresas, os professores tem grande dificuldade, pois a agenda de visitas nas empresas é restrita a poucas datas no ano. Ao contrário disso, a Honda no Japão, construiu uma passarela dentro da fábrica para que DIARIAMENTE, 2000 pessoas possam visitar a fábrica. A integração entre empresa e Academia, quando intensa, tem como principal resultado, a melhoria da qualidade nas próprias empresas. Ai mais uma vez falta iniciativa da própria Academia, dos empresários e do governo, que poderia criar regras específicas para melhorar esta aproximação.

 

6 – (Adolfino Neto) Como o Senhor vê a criação de um HUB Logístico na cidade de Feira de Santana-BA?

[Professor Leoman] Desde 2003 quando ministrei aulas na Faculdade FTC de Feira de Santana, havia o interesse do município em tornar-se uma grande referência na logística do Nordeste, com a criação de um Polo Logístico na região. Essa ideia foi alimentada durante alguns anos com o envolvimento de empresários e políticos da cidade, porém, este polo que inclusive estava previsto no PELTBAHIA, não saiu do nível das ideias. Com isso, perdem a cidade, o estado e o Brasil. Toda movimentação de carga que ocorre nesta região poderia ser mais barata com este HUB. Como no Brasil o meio empresarial é desmobilizado e desarticulado, é fato que ele só acontecerá com uma ação política longa e intensa.

 

7 – (Adolfino Neto) Por que os estoques continuam tão divergentes no Brasil?

[Professor Leoman] Mais uma vez, voltamos ao problema da cultura. O empresário brasileiro está interessado no lucro, e de preferência imediato. Eles começam um negócio e tem a forte noção de que tem que cuidar das finanças da empresa, evitando fraudes e desvios. Contraditoriamente, eles tratam os estoques como se fossem objetos sem muito valor. Não os enxergam como dinheiro. O que você fala em suas palestras a respeito disso é a pura realidade. Entendo também que há uma parcela de culpa da Academia, pois deveria enfatizar com muito mais intensidade esta disciplina, formando profissionais mais preocupados com o trato com as mercadorias, podendo ser os mesmos um diferencial em uma empresa onde o empresário traz consigo uma cultura pobre na gestão dos estoques. Há empresas no mercado que tem em torno de 99% do estoque correto. Este número crescia a passos curtos, mas devido ao barateamento de equipamentos e softwares, este cenário já apresenta um bom crescimento nos últimos dois anos.

 

8 – (Adolfino Neto) Qual o seu conselho para alguém que quer trabalhar nos armazéns, seja do mais baixo ao mais alto cargo?

[Professor Leoman] Não há uma fórmula mágica,   para que se obtenha bons resultados nesta área, é necessário estudar muito. Faça uma graduação e pós-graduação em logística. Em empresas organizadas, a contratação é feita com base em um perfil estabelecido para o cargo. Não adianta apresentar currículo com conteúdo de áreas afins. O escolhido será sempre quem tem a melhor formação. Não se limite ao que foi dado em sala de aula nas graduações e pós graduações. Procure publicações especializadas, encontre fóruns de discussão da logística, busque o diálogo com profissionais do meio. Tente fazer simulações das funções do mercado. Imagine-se executando funções específicas em logística. Em algum momento, você será selecionado.

 

9 – (Adolfino Neto) Quais são suas metas profissionais para os próximos dez anos?

[Professor Leoman] Minha meta principal seria fazer um doutorado, porém, não há uma exigência muito grande de mestres nas universidades. Neste momento estou participando da escrita de um livro, e pretendo fazer um doutorado em uma universidade pública, visando a redução de custos. O livro será para uso em concursos públicos, onde assumi o módulo de produção e logística. A Academia me encanta e continuarei com o meu trabalho de mestre, o qual me orgulho muito.

 

10 – (Adolfino Neto) Qual mensagem o Senhor deixaria para o mercado, uma dica, uma sugestão?

[Professor Leoman] Agradeço pela oportunidade da entrevista e gostaria de sugerir que você trabalhe no sentido de contaminar mais pessoas a doar um pouco do conteúdo de vida a sua cidade. O seu trabalho e o da Próton contribuem para uma melhoria da cidade e da região. Talvez passar a incentivar novamente a criação do HUB logístico de Feira de Santana, seja um legado que você pode deixar para a sua cidade. 

Para os jovens que pensam em evoluir na logística, volto a repetir. O segredo é estudar, estudar, e estudar!!

Obrigado

 

Entrevista gravada em setembro de 2016.

 

 

 

 

 

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